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  • Foto do escritorAdnan Brentan

Qual trilha você mais gosta?


"O desejo é o primeiro dado de nossa consciência: nascemos para a simpatia e a antipatia, o desejo e a vontade. A princípio de forma inconsciente, depois consciente, fazemos a seguinte avaliação: "Isso é bom, isso é mau". E um pouco depois descobrimos a obrigação. "Isso, sendo bom, é o que deve ser feito; isso, sendo mau, não deve ser feito."

Nem todas as avaliações são igualmente válidas. Somos levados a julgar o que nossos desejos e desgostos afirmam ser bom ou ruim. Com muita frequência, descobrimos que o veredito da suprema corte bate de frente com a decisão à qual chegara, rápida e levianamente, a corte de primeira instância. À luz do que sabemos sobre nós mesmos, nossos semelhantes e o mundo em geral, descobrimos que o que parecia bom a princípio pode, a longo prazo ou dentro de um contexto mais amplo, ser ruim; e que parecia ruim a princípio pode ser um bem que nos sentimos levados a realizar."

Aldous Huxley


Faz alguns dias no meio de uma aula de Pilates ouvi uma colega de turma afirmar: "Eu me conheço e não gosto deste tipo de exercício", e completou: "nunca gostei!"

Isso me fez pensar em algo que, ultimamente, aparece de forma recorrente em minhas reflexões. Aquilo que eu gosto e aquilo que eu não gosto. Por que eu gosto do que gosto e por que não gosto do que eu não gosto?


"Seus pontos de vista, suas opiniões, suas preferências, seus conceitos, suas metas e suas crenças: tudo isso são formas de reduzir o universo infinito para o finito, onde você pode ter uma sensação de controle.

A razão pela qual você construiu toda a sua estrutura mental, para começo de conversa, foi a tentativa de evitar a dor." Michael Singer


Instintivamente baseamos nossos gostos e preferências selecionando, em primeiro lugar, as coisas que não nos causam alguma dor ou desconforto (físico ou psicológico) e, em segundo, aquilo que pode nos trazer prazer e conforto. Desde que nascemos fazemos estas seleções. Quando bebês o desconforto físico nos fazia "sofrer" e buscar alimento e quando alimentados sentíamos segurança e conforto o que nos relaxava e relacionávamos isso com a sensação de prazer. Lembra da letra da música? "A gente quer prazer para aliviar a dor."


E tudo isso é normal e faz parte do pacote "ser humano". O problema é que, com o passar do tempo, uma infinidade de experiências vão sendo processadas e acumuladas:


Se experimentei frio em demasia: "Não gosto do frio!"


Se foi calor: "Não gosto do calor!"


Se, numa brincadeira que me diverte e me dá prazer, caio e me machuco, meu corpo e emoções vão ser pesados pela minha mente que julgará se a experiência valeu a pena. Se, mesmo com a dor sofrida, a satisfação e aprendizado gerados valeram a pena. Se o resultado for positivo há boa chance de repetir a experiência, mas se foi negativo vou passar a evitá-la. E assim se sucede com tudo a exceção daquilo que o nosso meio nos obriga a realizar independente de nossa vontade.


Todas as preferências são processadas e programadas assim. Desde o que comemos, ao que vestimos (para ser considerados belos), ao que falamos (para ser apreciados),...

Com o passar do tempo vamos lotando nossa mente com o acúmulo de experiências e perdendo nossa elasticidade interior. Vamos adquirindo uma rigidez que, "por vontade própria", vai restringindo cada vez mais aquilo que gostamos de experimentar.


O problema é que quanto menos experimentamos, menos aprendemos, menos nos aperfeiçoamos, menos evoluímos. E se você, como eu, acredita que o grande barato da vida é crescer e evoluir, a vida, com estas restrições, vai perdendo a graça. Os medos dos pequenos e dos grandes sofrimentos tornam-se os senhores da nosso cotidiano e guiam nossas escolhas. Ironicamente esta fuga das experiências, para não sofrer, acaba por se tornar o sofrimento derradeiro que podemos chamar de infelicidade e que se manifesta em alguma forma de apatia, tédio ou depressão. Isso ocorre porque nossa alma ou nosso eu é, justamente, alimentado pelas experiências que podem nos elevar a patamares superiores de felicidade. Felicidade que não é a ausência de dores ou existência de prazeres, mas o sentimento elevado de ligação com a natureza e com os demais, ligação consigo mesmo e com Deus.




Nas pequenas aventuras e trilhas que realizamos nos expomos, o tempo todo, a estas forças aparentemente opostas. E, minuto a minuto, batimento a batimento do coração, flexão a flexão de músculos, gota a gota de suor, somos convidados a experimentar e podemos escolher nos abrir à experiência e usar cada momento para nos elevar física e moralmente ou escolher nos fechar e tornar aquilo um suplício e penalização. Podemos reclamar do frio ou do calor, podemos nos irritar com a vegetação (maldito bambuzal), podemos maldizer o barro que nos suja e nos faz escorregar, podemos nos queixar dos muitos obstáculos em forma de rochas, troncos, raízes. Podemos reclamar da chuva, da neblina que encobre o visual, podemos reclamar do Sol. Podemos nos apegar a todos os incontáveis incômodos, momento a momento ou podemos relaxar internamente e nos desapegar deles e passar a fluir pela trilha com o espanto e a alegria de uma criança que descobre seu potencial brincando, descobre o prazer genuíno de superar adversidades, descobre a capacidade de aprender coisas novas, de se tornar mais forte, mais viva, mais inteira, mais humana e mais divina.


"Diante de um ser humano que não se deixa desviar por sentimentos provocados pelas superfícies daquilo que vê, mas responde corajosamente à dinâmica de sua própria natureza - um ser humano que, como o descreve Nietzsche, é 'uma roda que gira por si mesma' - as dificuldades se dissolvem e a estrada imprevisível vai sendo formada à medida que ele caminha." Joseph Campbell


Então, quando me perguntarem novamente qual a trilha que eu mais gosto, responderei:

A trilha de hoje!

Quando me perguntarem novamente qual tipo de trilha que mais gosto, responderei:

O tipo de trilha de agora!


A trilha e o tipo de trilha que mais gosto é a aquela que me eleva a mim mesmo e todas elas, se eu me abrir para elas, podem me elevar a mim mesmo.


Eleve-se na trilha!



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