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  • Foto do escritorAdnan Brentan

Conhecendo um lugar de sonho

Atualizado: 25 de abr.

Era um lindo dia de sol em meio a mata verde cercada por paredões de pedra imponentes com suas formações incríveis. Em meio a estas formações existem um grande número de "tocas" com registros reais, em forma de pinturas rupestres, do homem primitivo que viveu por lá talvez a dezenas de milhares de anos.



Mas a principal motivação para estarmos lá era tomar contato com um ambiente natural, pouco adulterado pela presença humana e que conserva uma esplendorosa beleza rústica e uma série de desafios físicos em seus caminhos bastante acidentados. Secundariamente havia o interesse de poder ver com os próprios olhos estes vestígios humanos no que podemos chamar de arte primitiva em forma de pinturas que era a única forma de deixar registros mais duradouros. Era uma forma rudimentar de "contação" do que era o seu ambiente e quais eram os seus hábitos.


O nosso guia Nestor, nativo da região, fez uma abertura mais longa onde numa narrativa com muitos detalhes e carregada de sentimento nos falou como nascera, se desenvolvera e como era mantido o Parque Nacional da Serra da Capivara criado em 1.979 que, pelo seu valor histórico e cultural, foi declarado pela UNESCO, em 1.991, Patrimônio Cultural da Humanidade. Provavelmente seja o parque nacional mais bem estruturado do Brasil, embora tenhamos muito pouca divulgação dele.


Na fala e emoção de Nestor se destaca o poder pessoal da pessoa que primeiro deu importância e com paixão fez as descobertas e estudos deste material humano muito antigo e valioso. Doutora Niède Guidon que nasceu no interior do estado de São Paulo, filha de pai francês e mãe brasileira.


A história de Niède é rica, repleta de desafios, mas sobretudo se destaca o seu poder de realização, sua vontade inquebrantável. Um exemplar genuíno e muito raro de ser humano heroico que conjuga em si, muito bem, uma sonhadora visionária e uma realizadora pragmática.


O sonho "começa" 1.963 quando uma pessoa mostra para ela fotos incríveis que sugerem a presença humana primitiva numa área ainda não explorada pela ciência. Mas em 1.964 ela se viu obrigada a deixar o Brasil e se estabeleceu em Paris de onde só retorna a primeira vez em 1.973 e busca conhecer os locais com as pinturas que só havia visto por fotos. A partir daí retorna muitas vezes. Em 1.975 obtém seu diploma de doutorado na Sorbonne com tese baseada nas pesquisas feitas na Serra da Capivara. Em 1.978 convenceu o governo francês a estabelecer uma missão arqueológica para estudar a pré-história no Piauí. Até sua aposentadoria como docente, Niède Guidon seria a líder da missão, composta por pesquisadores nacionais e internacionais e assistentes de campo locais. Acompanhada inicialmente por mateiros da região, foi desbravando a área e encontrando inúmeros sítios arqueológicos. Muitas escavações, muitos estudos, a criação do Parque.



Quando começou suas pesquisas, na região muitas pessoas mal tinham água saudável para consumir. Conta Nestor que muitas vezes tomavam água salobra para sobreviver afinal é uma área remota onde predomina o bioma árido da caatinga. Então em paralelo, e tão importante quanto, Liède causa uma verdadeira transformação da região. Idealiza e realiza muitos planos de ordem social melhorando imensamente a qualidade de vida dos habitantes. É capaz de articular politicamente trazendo os recursos financeiros necessários para estruturar o Parque e ao mesmo tempo desenvolve inúmeras ações que trazem educação, saúde e desenvolvimento financeiro e cultural para as pessoas da região. Fundou escolas, empresas, associações,... Promoveu a gente carente, mas valente, a verdadeiros guardiões deste patrimônio natural, histórico e cultural.


Um são orgulho se destaca na fala de Nestor que nos contou muitos causos com muitas lições que Niède naturalmente e espontaneamente era capaz de dar - mesmo, intuo, sem perceber o alcance das suas ideias e ações.


Seu sonho elevado, que ainda está sendo plasmado, transformou e continuará transformando a vida das pessoas da região, mas não só da região pois, nós que tivemos a oportunidade de percorrer os caminhos de Liède, por vários dias, ficamos impactados com a beleza cênica e inspirados com a capacidade humana de evolução.


Já no momento após a primeira fala de Nestor ficamos em estado de assombro por tudo que ouvimos. Eu, que normalmente abriria a atividade (como sempre faço) com algum texto de cunho reflexivo, optei por, com os olhos marejados e a voz ligeiramente embargada, falar da constatação do poder de uma pessoa canalizada que sonha, vivendo sua vocação, atendendo o chamado da sua alma. Ela é capaz de contagiar outras pessoas com seus sonhos tornando-as também sonhadoras e assim unidas realizam algo grandioso do ponto de vista histórico e grandioso também do ponto de vista humano. Além de transformar ela foi capaz de inspirar e motivar, com o amor e com ações objetivas, aqueles que a ela se acercaram.


Era um sonho solitário que se tornou um sonho coletivo, era uma uma mente desperta que foi capaz de despertar outras mentes, eram dois braços realizadores que se tornaram centenas (ou milhares) de braços entregues a realizar o sonho de muitos que nasceu de um espírito sonhador e tomou forma em uma mente criativa e bem treinada capaz de treinar outras mentes. Mas sobretudo foi um ser humano canalizado que com seu coração tocou muitos corações que agora batem pela mesma causa e trazem Vida e dignidade para muitas pessoas.


E eu por alguns instantes, além do assombro, tive que lidar com a constatação da minha própria indolência em realizar os meus sonhos e perceber o meu próprio egoísmo ao privar o mundo destes mesmos sonhos.


Os sonhos verdadeiros não "pertencem" só a quem sonha, os sonhos verdadeiros são a inspiração divina buscando caminhos para a plasmação do "Reino dos Céus" aqui na terra. Nós somos receptores e se fomos capazes de captar o sonho "divino" é porque também somos capazes de realizá-los.



Graças a este sonho que possibilitou a estruturação e manutenção física deste lugar de sonho é que agora podemos desfrutar de sua bela história, percorrer suas desafiadoras trilhas, contemplar sua beleza arrebatadora. Podemos nos impregnar da energia da Vida que por lá circula. Podemos nos elevar por seus caminhos e inspirados nos elevar também internamente.


Quanta importância, tempo e energia você tem dado para "seus" sonhos?


No meu caso, julgo que não o suficiente... mas posso dar mais!






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