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  • Foto do escritorAdnan Brentan

"A vida é uma aventura ousada ou, então, não é nada."

"É assim que a coisa funciona. Em toda situação desafiadora, damo-nos uma cutucada: encorajamo-nos a nos sentirmos um pouco mais corajosos, a agir com um pouco mais de ousadia - a transpor as muralhas do medo, da ansiedade e da impotência. A ser um pouco mais presentes. E gradualmente, com o tempo, nos vemos onde queremos estar... embora nem sequer tivéssemos conseguido definir tal lugar quando começamos." Amy Cuddy


Faz alguns dias tive o privilégio de mais uma vez guiar um grupo de pessoas na trilha que batizei, carinhosamente, de Vale Amarelo. Mas preciso confessar que não é incomum que eu sinta uma certa resistência interna em ofertar esta experiência intensa. Embora existam muitos motivos favoráveis para realizá-la como: contato direto com a natureza "intocada", o prazer de contemplar um cenário de beleza espetacular, a alegria de poder brincar na água em um dia quente em pequenas cachoeiras e poços de água translúcida,... por ser uma atividade num ambiente em que a maioria de nós nunca teve experiência prévia, ela se torna mais arriscada que o normal.



Caminhar predominantemente pelo leito do rio, pisando em terreno bastante irregular, muitas vezes sem ter certeza de onde está pisando, tentando manter o equilíbrio, correndo o risco de escorregar a qualquer momento e sofrer uma queda, tendo que usar mãos e braços para se apoiar em pedras e ganhar patamares mais altos, tudo isso com a água passando por você e criando resistência. Sem falar nos pontos com obstáculos mais longos e escorregadios onde precisa da ajuda de cordas para superá-los. Pode surgir o medo de cruzar com animais peçonhentos nos poucos, mas desafiadores, trechos de mata também quase intocada. Há muitas oportunidades para que algo possa dar errado. Por isso sempre ronda pelas sombras da minha mente o medo mais ou menos secreto de que alguém sob meus cuidados se machuque. Mas quando me lembro da força da experiência e dos resultados humanos proporcionados por ela, volta o ânimo e a motivação para o sacrifício da minha comodidade, já que seria mais fácil guiar em locais mais "seguros".


"Evitar o perigo não é, a longo prazo, tão seguro quanto expor-se ao perigo. A vida é uma aventura ousada ou, então, não é nada."

Helen Adams Keller (1880-1968) aos dezoito meses de idade ficou cega e surda (daquelas coisas muito difíceis de acreditar), mas isso não a impediu de se tornar célebre escritora, filósofa e conferencista.


Nesta atividade ajudo a "dar uma cutucada" na coragem de quem a enfrenta comigo. E aqui há um segredo não secreto da Vida e da Natureza: a evolução se dá, na maior parte, por uma mistura de esforço e aventura (enfrentar o desconhecido e o perigoso). Sem esforço e aventura não teríamos saído da "Idade da Pedra". E não só os seres humanos, tudo que é vivo só evolui por conta das dificuldades e o desenvolvimento das capacidades para superá-las. Portanto, quando coloco estas pessoas nesta situação de risco, estou a serviço da Natureza e da Vida.


Quase sempre, na abertura de uma destas atividades, repito a fórmula já muito conhecida, mas que precisa ser repetida de que: "A pessoa que inicia a aventura não é a mesma que termina."


Não é a mesma, porque evolui. Na verdade alguns minutos após entrar no leito do rio ela já vai se familiarizando com o terreno, vai reaprendendo a se deslocar num ambiente tão desafiador. Cutucada ela desperta a coragem, reduz a ansiedade, controla o medo e vence a impotência.


Uma "trilha" destas ensina a preciosíssima lição de que o mais importante é estar presente, pois se a pessoa se ausentar do agora e perder a atenção, vai ter muito mais chances de realmente se machucar. O que importa é a manobra que está realizando naquele exato momento e em seguida dar uma olhadinha no próximo obstá-lo para superá-lo com coragem e a habilidade que conquistou momentos antes.


Após vencido todo o desafio muitos guardam conscientemente este registro, mas, mais do que guardar o registro, elas são transformadas pela experiência. Elas crescem em agilidade física e, principalmente, crescem na capacidade de enfrentar desafios, mesmo que não se deem conta disso. De alguma forma levam da trilha a capacidade de lidar com obstáculos (desafios) e o desconhecido. Sem perceber tornam sua presença e coragem mais aptas para serem usadas em outros tipos de desafios.


Pessoas que tentam evitar a todo custo o esforço e o perigo, acabam por se tornar irrelevantes para Vida. É uma pena, pois a Vida ama o esforço e os desafios, já que sua característica é de expansão e refinamento e estes não vão ocorrer sem esforço e a superação dos perigos ou dificuldades. Daí surgem muitos dos males físicos e, ainda mais contundentes, males psicológicos que assolam a humanidade talvez mais do que nunca.


Citando a mim mesmo:

"Por isso, aquela brincadeira que se faz sobre a amnésia misteriosa que acontece com todo aventureiro, que, mesmo depois de passar por "perrengues" e dificuldades dolorosos nas trilhas, volta a planejar e buscar novas aventuras (onde passará por novas dificuldades), não é verdadeiramente uma amnésia. Na verdade é o oposto disso. É a memória do espírito que, tendo vencido e colhido os frutos da vitória, quer mais desafios e vitórias. Quer continuar crescendo!"


E na sequência recordo a provocação contundente de Soren Kierkegaard na obra O Desespero Humano:

"Aos olhos do mundo, o perigo está em arriscar, pela simples razão de se poder perder. Evitar os riscos, eis a sabedoria. Contudo, não arriscando, que espantosa facilidade de perder aquilo que, arriscando, só dificilmente se perderia, por muito que se perdesse, mas de toda a maneira nunca assim, tão facilmente, como se nada fora: a perder o quê? A si próprio. Porque se arrisco e me engano, seja! A vida castiga-me para me socorrer. Mas se nada arriscar, quem me ajudará?"


Uma constatação importante: mesmo a trilha sendo mais perigosa, as pessoas tendem a se machucar menos. É evidente que isto ocorre porque estão mais presentes e atentas, estão usando seus talentos e capacidades, estão mais vivas.


A Vida respeita e apoia os corajosos. E os covardes? Os covardes sempre dependerão da compaixão dos corajosos.



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